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Sankofa: A História dos Afro-Curitibanos


HQ relembra personalidades negras de Curitiba e traz o direito à memória da população negra


Fotografia que mostra uma mão negra segurando um quadrinho. Ele é azul. Sua capa é uma árvore com três pessoas ao seu redor. Atrás da HQ, há uma parede amarela com um nicho peto com livros
Foto: Inara Chagas

Nota das Cartunadas: este texto, diferente da maioria do nosso site, não possui transcrição em áudio por problemas técnicos que estamos enfrentando. Assim que isso tudo passar, iremos incluir a versão em áudio, tudo bem?


Título: Sankofa: A História dos Afro-Curitibanos

Autores: Raphaela Corsi

Editora: Humaitá

Número de páginas: 64

Ano de publicação: 2022


“Quando a noite chegava, vinha com ela o trabalho. De dia também tinha trabalho. Na verdade, o trabalho nunca parava. O padre sempre dizia que o trabalho e o esforço salvam as almas de quem vai ter o paraíso depois da morte. Da NOSSA morte. O paraíso dele parece que já veio em terra. Mas eu gosto de pensar que é a noite que tudo começa.


“As luzes não se acendem sozinhas”, é o que eles dizem. Mas as estrelas aparecem sem esforço, o que me faz pensar que, se os trabalhadores, escravizados ou não, movimentam tudo com muito suor, é porque alguns deixam o que podiam fazer em nossas costas. As estrelas sabem dividir melhor as funções. Nenhuma tenta brilhar mais do que o sol e, cada qual, ao seu modo, existem brilhando o quanto podem.


Às vezes, as estrelas mudam de cor. Dá pra ver quando elas piscam azul, amarelo, branco, preto… mas nós não piscamos. Se as pessoas pudessem mudar de cor com essa frequência, iriam inventar outro jeito do dinheiro e do poder ficar só com alguns.”


Há quem acredite que não existem pessoas negras no Sul do Brasil, ou que essa parcela é tão ínfima que passa despercebida. Não é difícil entender de onde vem este pensamento, mas é importante dizer que ele é equivocado. Não apenas há uma população negra no Sul do país como ela também luta pelo seu direito de existir e de ser lembrada. Nós, Cartunadas, duas mulheres negras e do Sul, representamos isso. E Sankofa: A História dos Afro-Curitibanos, de Raphaela Corsi, também.


Ler uma história sobre a população afro-curitibana sendo uma paranaense e amante da capital do Paraná foi como um presente. Apesar de sempre me identificar como uma pessoa negra, é especialmente difícil lidar com essa questão no estado do Paraná. Se viajo pelo país, sou lida como sulista já de cara. Se desço para Santa Catarina ou Rio Grande do Sul, não sou sulista o suficiente. Junte isso ao fato de ser uma pessoa negra nessa região e ter que ouvir coisas como “Nem tem gente negra lá”. Difícil.


O fato é que sempre ficamos de escanteio. Digo isso enquanto população negra, em geral, mas especialmente enquanto população negra sulista. Afinal, o Sul é o lugar dos colonos, das famílias tradicionais, das festas típicas alemãs, do frio, das pessoas antipáticas, dos gados, dos patriotas e neonazistas. Em verdade, é isso tudo e mais um pouco, mas apagar a existência de quem luta diariamente para ser lembrado também é violento. Nós, pessoas negras, temos tanto direito à memória quanto vocês. E, para quem, ainda assim, não acredita que há resistência negra Sankofa: A História dos Afro-Curitibanos é leitura obrigatória.


Dividida em três contos, a história em quadrinhos traz histórias reais e ficcionais tendo como elemento principal a cidade de Curitiba e pessoas negras na capital. Ao fim do quadrinho, há um grande índice de imagens, mostrando a origem de boa parte dos elementos gráficos da HQ e mostrando que uma boa pesquisa e estudo é essencial para um trabalho de qualidade e que, acima de tudo, toque nossos corações.


Com uma leitura rápida e fluida, é possível terminar a obra em pouco tempo, mas a recomendação aqui é que a degustação de Sankofa: A História dos Afro-Curitibanos seja feita mais de uma vez, pois em cada experiência de leitura um novo elemento subjetivo é captado. Seja na riqueza das palavras — o texto dá um show aqui, sem menos — ou nas ilustrações, Raphaela Corsi transpassa a emoção (e conhecimento) em cada traço.


Como crítica construtiva, vocês que leem minhas resenhas já sabem: as letras. A escolha de uma tipografia mais estilizada não me agrada visualmente e nem tecnicamente, uma vez que dificulta a leitura. Além disso, uma revisão minuciosa na ortografia seria interessante para valorizar ainda mais a HQ. A ausência de pontuações na maioria dos diálogos me deixa pessoalmente incomodada — mesmo sendo uma escolha. Não é algo que prejudique o entendimento de quem lê, mas é um refino que, ao meu ver, sempre cai bem.


Por fim, termino este texto com um sentimento que não costumo ter com a maioria das obras: a vontade de ler várias vezes e de carregar o quadrinho sempre na mochila. Foi uma leitura difícil emocionalmente falando, mas que também me trouxe muito conforto e nostalgia. Sankofa: A História dos Afro-Curitibanos é para que nunca nos esqueçamos de nossas origens e para que a sociedade nunca nos apague.


Seguiremos sendo estrelas. Não podemos mudar de cor, mas sabemos que ninguém nunca irá diminuir ou apagar a nossa luz.


Nota: 5/5


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